
Em 1984, voltei ao Rio depois de três anos morando em Nova York.
Trazia três malas, alguns dólares e um certo desconforto no peito. Eu tinha visto de trabalho e caminhava para um green card, mas o Brasil que me recebia estava mergulhado na campanha das Diretas Já. Que país eu iria encontrar ?
Henfil, no dia em que nos reencontramos, resumiu com sabedoria:
“Você precisa mergulhar nas águas do Rio São Francisco para voltar ao Brasil.”
De certa forma, eu era quase uma americana: calçava sandálias com meias, sonhava em inglês e usava cinto de segurança para dirigir.
Foi então que os amigos se aproximaram, trazendo propostas de trabalho que ajudaram a me reconectar com o meu país. Primeiro, Cidinha Campos me convidou para integrar a equipe do programa “Cidinha Livre”, na Rádio Tupi, como redatora ao lado de Heloneida Studart. Conviver com duas mulheres tão brilhantes e engajadas nas mudanças do país foi um privilégio — e o primeiro banho no Rio São Francisco.
Quase ao mesmo tempo, Régis Cardoso, ex-marido e amigo, me chamou para ser pesquisadora de arte no programa “Caso Verdade”, na TV Globo.
Recebiam dezenas de cartas reais e era preciso sensibilidade para descobrir boas histórias. Fui fundo nas leituras…
Em pouco tempo, Régis seguiu para outro projeto e “Caso Verdade” ficou sob a direção de Reynaldo Boury, um mestre da narrativa sensível. Em uma conversa sobre novas pautas, comentei com Boury que a atriz Darlene Glória, Melhor Atriz no Festival de Berlim por Toda nudez será castigada, havia se tornado pastora e estava pregando num teatro em Copacabana.
Ele pediu que eu investigasse. Voltei com uma história tão forte que tive a oportunidade de estrear como autora em “Todo Pecado Será Perdoado”, ao lado de Ivan Yazbeck.
Outros “Casos Verdade” vieram, até que precisei fazer uma escolha.
Eu já estava dividida em três frentes: TV Globo, Rádio Tupi e o convite para voltar ao jornal O Globo. Na sequência já aparecia o Rock in Rio, o Canecão e a assessoria de imprensa com tantos movimentos culturais inesquecíveis.
Não foi fácil decidir. Naquele momento, a TV Globo começava também a formar oficinas para jovens autores, e fui convidada.
Mas sou muito feliz pelo caminho que escolhi — e imensamente grata à TV Globo, que me ensinou tanto, me enraizou de volta no Brasil e me abriu as portas para ouvir, sentir e contar histórias.
Porque mergulhar de volta ao Brasil é, também, reaprender a viver com o coração.