Os guardados…

Arrumando a casa no final de uma pequena obra, abri o depósito onde guardo objetos raramente usados, coisas que não consigo jogar fora, e um pedaço esquecido de mim veio à tona. Além de alguns livros e mapas de viagens, encontrei a caixa com recortes das reportagens que fiz no jornal O Globo – preciso digerir melhor prá escrever – , outra com enfeites de Natal que não uso pois perdi a graça da festa, uma pasta com contas antigas de luz e telefone, e atrás disso tudo surgiram as malas. São 13 no total, entre malas enormes, sacos de viagem e pequenas com rodinhas, todas praticamente com vida própria, CPF, RG e outras identificações… Ainda tenho o saco de viagem que trouxe parte da minha mudança dos Estados Unidos. É tão grande que quando começou a rodar na esteira do aeroporto do Galeão percebi o olhar de dois fiscais da alfândega que, no meu primeiro movimento pra retirar da esteira, gentilmente fizeram o serviço. E é claro que vasculharam tudo e só encontraram livros, agulhas de tricô novelos de lã – eu fiz muitos suéteres em Nova York! -, travesseiros, lençóis etc etc… Nem me lembrava mais da mala jumbo em que trouxe a mudança de Lisboa, revi as malas vermelhas médias para as temporadas maiores em São Paulo, e as pequenas azuis com a logo Nestlé usadas em viagens curtas.

Enquanto limpava as malas relembrando o que carregavam em suas épocas, dos figurinos tamanho 38 para o atual 46, os sapatos para os pés que eram 36 e ½ e ganharam 1 ponto depois do período americano, os quilos a mais, cabelos brancos e rugas, me espantei com a capacidade que ainda tenho de guardar coisas prá nada. Eu já me libertei de tantas tralhas, mas algumas insistem em se manter, fazer teias, juntar poeira, armazenando o nada… As malas estão vazias, eu é que carrego lembranças e dou trela à memória.

A Guta Mattos, que foi toda poderosa diretora de elenco da TV Globo nos anos 70, uma vez me disse que uma mudança representa praticamente um incêndio na vida de uma pessoa… E eu sei disso. Mudei mais de 30 vezes em 30 anos e se tivesse a certeza que nunca mais sairia daqui, faria uma fogueira de forma figurativa, exorcizando o passado, queimando grande parte das malas. Sei que nada adiantaria, as historias continuam comigo. As malas limpas e revisitadas já seguiram para o depósito, sabe lá quando voltarão à vida.

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