Engole o choro!

Na fila do caixa eletrônico no banco, uma moça a minha frente segurava pela mão um menino que não tinha mais do que 2 anos. De repente ele se soltou e saiu andando com as pernas ainda não muito firmes em direção a uma parede de vidro, certamente atraído pelo movimento de carros na rua. O menino não percebeu que era vidro, bateu com a testa, chorou e a mãe riu. A mãe não sorriu, mas riu muito do erro do filho repetindo “bem feito, é prá aprender… menino levado não me deixa em paz”. Ela estava com muita raiva.

Fiquei constrangida com o gesto que considerei cruel. Prá aprender não é preciso bater com a cabeça nem humilhar o filho. O riso da mãe estimulou as demais pessoas que estavam na fila e menino ficou envergonhado e engoliu o choro. Ficou olhando para os adultos sem entender o que de tão errado poderia ter feito para ser tratado assim. Tive vontade de pegar no colo, fiquei com pena, principalmente do choro engolido. Meus pais usavam raramente a psicologia do chinelo, só em situações muito especiais. Mas engolir o choro era uma constante. Mamãe não precisava falar. Era um olhar e nós entendíamos. Certamente por isso me tornei uma chorona de situações inusitadas.

Quando em 2003 a Beta (Roberta Medina) me chamou para dizer que eu faria parte da primeira equipe que iria para Portugal preparar o Rock in Rio Lisboa comecei a chorar compulsivamente. Eram tantas lagrimas e soluços que a Beta, muito sem graça, dizia “tia Léa, se não quiser não precisa…!” E olha que eu queria muito ir, e fui…

Meu choro não é de dor ou mágoa, mas vem como rasgando um nó entalado na garganta, acompanhando um sentimento que pode ser até de alegria, para explodir nas lágrimas. Choro do óbvio: cinema, casamento, música, novela, até comercial na TV… Não choro em situações onde o pranto é quase coletivo, como enterros. Sou prática, como boa capricorniana. Não derramei uma só lagrima nos enterros, do meu pai, do meu irmão e da minha mãe. Mas choro de saudades deles ainda hoje.

Há muito tempo decidi que não engulo mais choro. Mas outro dia ao assistir a um filme fiquei imensamente emocionada, afinal eu escrevi o argumento da historia que rolava na tela. O filme ainda não estava finalizado, mas era tão lindo e o medo de perder algum pedacinho com as lágrimas era tal, que engoli o choro. Desta vez com justa razão.

Breno e João Miguel durante as filmagens.

Breno e João Miguel durante as filmagens.

Em tempo, o filme se chama “Beira do Caminho”, direção do Breno Silveira, produção da Conspiração Filmes, o personagem principal é interpretado pelo ator João Miguel, premiado pelos trabalhos em filmes como “Estômago” e “Cinema, Aspirina e Urubus”. Dira Paes é Rosa, ex-noiva de João que não consegue esquecê-lo. O filme conta a história do caminhoneiro João, que, após um grande trauma, resolve cruzar o Brasil e nunca mais voltar a sua cidade natal. Ao dar carona a um menino, que sonha em encontrar o pai, João embarca numa viagem ao passado que mudará o destino dos dois. O garoto Duda é interpretado por Vinicius Nascimento, que atuou nos filmes “Quincas Berro d’Água”, em “Ó, Pai Ó” e na série de mesmo nome exibida pela TV Globo. As filmagens foram realizadas no interior da Bahia, além de Paulínia, em São Paulo. “Beira do Caminho” tem coprodução e distribuição da Fox Film do Brasil.

 

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4 Respostas para “Engole o choro!

  1. Lindo texto, Léa, mais uma vez!

  2. As vezes segurar o choro é mais fácil do que segurar a humildade: Minha mãe é foda! Depois de toda uma história de glórias em quase todos os segmentos artísticos possíveis, agora debutando também no cinema, logo num mega projeto com os melhores e mais premiados profissionais do ramo! Que seja o primeiro de muitos roteiros de filmes, peças de teatro, etc.

  3. não perco o filme.
    nem o choro.
    beijos.

  4. Usei tb a expressão segura o choro com meus filhos, hoje totalmente adultos e não sei se ficou alguma mágoa, mas aprenderam a lutar por suas conquistas. Será que o choro segurado ajudou/ Sei lá, mãe inventa coisas q até papai do céu duvida! Parabéns Léa!

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