“… respira… calma… bebe um pouco d´água, assoa o nariz … telefona para o seu irmão… pra sua mãe não precisa, afinal você acaba de dizer que quer matá-la, mas anyway lembra que ela te ama…Telefona para o terapeuta, que tal um psiquiatra? … Não se assuste com psiquiatras, são médicos simplesmente médicos como oftalmos, ginecos, ortopedistas e cuidam da gente… não desista meu bem, tudo vai melhorar…”
“… pega um avião agora e vem passar uns dias comigo… vou arrumar seu chalé… dor de amor se cura com sol, banho de mar, colo e risadas… “
“…quantos desafios…a vida é assim, cada dia uma surpresa… as vezes boas, outras nem tanto, mas é o aprender desta encarnação… e as vezes tudo acontece ao mesmo tempo…quando só chegam fatos mais difíceis penso no que tenho que aprender… as vezes nada a aprender, apenas uma distração como os óculos que quebraram, um mal contato na antena da tv, nada disso pode tirar o nosso sono, são apenas coisas, não a nossa essência…”
“…amor não tem jogo de conquista, tem que se jogar de cabeça e viver…”
Resumo de algumas conversas por telefone, email, whatssap, messenger, dos últimos dias. Um exercício de abrir os ouvidos e o coração para quem chegar. Sou grata pela confiança, sou feliz quando tento acalmar, trazer à lucidez, puxar os pés para o chão, ajudar com palavras, um carinho, um colo, mesmo que a distância. Falo e escrevo tudo o que acredito. Faço o que gostaria que fizessem comigo. Já tive dores, baqueei, me atirei no chão, pedi misericórdia, mas o desafio de dar certo sempre foi mais forte. Nas preces agradeço pela saúde mental e física. Temo mais o desespero, o impensado, a loucura do que a doença física. O mental é visto como um estigma, pior que a lepra no tempo de Cristo… O físico, mesmo o mal desconhecido, todos falam, pesquisam, buscam soluções…
Há pouco mais de um ano perdi uma amiga para o desespero. Se soubesse antes, se pudesse falar não sei se ajudaria, mas teria me empenhado pois conhecia um pouco da sua linguagem. Durante um tempo morei em seu apartamento em São Paulo e montamos muitos quebra-cabeças, destes enormes, com mais de mil peças. As vezes acordava muito cedo e já a encontrava em volta da mesa procurando “aquela peça” para fechar o quadro. Algumas montagens difíceis, como uma estação de esqui onde quase tudo era branco, mas conseguíamos. Radiante, generosa, boa de conversa, risada solta, ela esqueceu que a vida nada mais é que um quebra-cabeças e nem sempre achamos a peça num primeiro olhar. Quando soube o fato já tinha acontecido e, como na canção, “estava lá o corpo estendido no chão”…
Nas últimas conversas destas semanas momentos fortes com queridas amigas: uma com 42 anos, outra quase aos 70. Mulheres lindas e sem rumo. Desencantadas, desesperadas… Uma conheci bebê, a outra começando a brilhar. Sinto-me impotente diante do sofrimento alheio, só posso ouvir, falar algumas coisas que me passam pela cabeça e quando percebo fogem pela boca…Às vezes magoo como o dia em que perguntei para uma amiga em crise :“até quando você vai se portar como uma menininha e continuar apanhando do seu pai?” Dias depois ela contou que chorou muito repetindo a pergunta e constatando que realmente se colocava em situações em que apanhava do mundo…
Estas “psicologadas” vem do nada, ou de tudo o que vejo por aí. Apesar de fazer uma vigília constante à saúde mental creio que o equilíbrio que busco vem apoiado num livro que há 14 anos mudou minha vida… Mudou porque chegou na hora em que eu estava destroçada com a perda de um irmão e precisava fazer alguma coisa para acabar com tanta angustia que nem cabia mais no meu peito. Um amigo sugeriu “Um Curso em Milagres”, um livro que não estava em livrarias, sob encomenda aumentava a expectativa. A primeira vista é muito complicado. É dividido em três partes, a primeira tem mais de 700 páginas. A essência dos seus ensinamentos é de uma simplicidade estonteante e baseia-se no princípio de que “nada real pode ser ameaçado…. a projeção faz a percepção. O mundo que vês é o que deste ao mundo, nada mais do que isso”. Fala sobre a não culpa e a não condenação, provoca o julgamento que fazemos de nós mesmos…Nos tira da cruz aonde nos crucificamos.
A vida não se resolve com um livro, nem sei se este é a salvação. Mas creio que a vida se resolve na consciência de que o caminho as vezes árduo. É ser autodidata, aprender fazendo. Não sou a rainha dos acertos, tão pouco quero ser canonizada… Estou em constante busca de melhoria interna mas ainda erro muito, sou pavio curto, exigente e convivo com tudo isso sem culpa. Nada tira o meu sono. Posso até acordar na madrugada pensando na solução de alguma questão e depois volto a dormir. Pode ser que amanhã precise do colo dos amigos. Já me atirei de cabeça no espaço sem rede de segurança e mãos surgiram para me acudir. Quem sabe aconteça algum revertério, bata um pavor e precise de aconchego. Sei que os amigos vão aparecer de novo pois uma coisa aprendi: o que se dá é o que se recebe.