Na pequena vila onde moro quando alguém morre é praticamente feriado. Sem rádio nem alto-falante a noticia corre rápido, de porta em porta, na boca das crianças, no grito dos jovens, na velocidade das bicicletas. As mulheres deixam seus afazeres, abandonam as panelas no fogão, pegam as crianças e vão em bando para a casa do falecido avisando com quem encontram no caminho. É uma comoção!
Sabemos exatamente quanto somos, talvez pouco mais de 600, e a partida de seja lá quem for é sentida. Na última quinta-feira Helenita estava preparando o almoço aqui em casa quando o telefone tocou. Ouvi o seu grito, corri para acudir. Em prantos, com a perna bamba sentou na cadeira da varanda e contou que Da. Santinha, sua ex-sogra, tinha morrido. Dei-lhe um copo d água com açúcar e mandei ir para o velório.
Hoje ela voltou contando detalhes do acontecido. Da. Santinha tinha um sopro no coração, acordou fraquinha, tomou banho e se aquietou. O neto foi ver, o coração tinha parado. Mas o corpo continuava quente. Alguns diziam que ela ainda estava respirando, chamaram o médico do posto de saúde que atestou a morte. Mas ninguém queria acreditar. Limparam um espelho e colocaram embaixo de suas narinas para provar que estava respirando, chegavam a ver o suor refletido. Outros sentiam as têmporas pulsando e chegaram a afirmar que ela tinha piscado os olhos. Resolveram então levar para o hospital. Colocaram a moribunda no carro, atravessaram na balsa, a família chorando num pré velório. No hospital o médico foi taxativo: nada mais o que fazer. Voltou o corpo atravessando o rio João de Tiba agora já num caixão e com um pouco de formol. O velório rolou a noite inteira na Assembléia de Deus. Muito choro, desmaios e surpresas com a chegada dos parentes que vieram de Eunápolis, Vitória e arredores. E entre as muitas preces alguém pediu que Jesus viesse à Terra e repetisse o milagre que ressuscitou Lázaro no 3º dia. Mas o Mestre devia estar muito ocupado. Na sexta-feira pela manhã um cortejo de carros levou Da. Santinha com 81 anos até a morada final no cemitério de Santo Antonio, no povoado vizinho. Neste dia também ninguém trabalhou, afinal é preciso se recuperar de tanta dor. Hoje, no 3º dia, ela não ressuscitou mas depois de uma semana com chuva o sol apareceu. A vida continua, como se nada tivesse acontecido, até um próximo velório.
Dona Santinha há de ter ido pro céu
Tantas filhas, filhos, netos…
RIP