Começo escrevendo na cabeça. As vezes surge um parágrafo inteiro, fico repetindo para não perder até chegar para o papel ou amadurecer. Em outras, os pobres textos morrem antes do papel, se perdem nos labirintos do cérebro e podem retomar algum dia sem qualquer aviso. Visualizo estes labirintos exatamente como aparecem nas imagens dos cérebros, cheios de meandros, cobrinhas onde se escondem boas ideias e inspirações. Fico tentando aguçar para ver se retorna alguma frase bacana para escrever nesta crônica, mas enquanto não surge vou colecionando bons temas como por exemplo, criar um bloco para o carnaval chamado “Caiacanga”. A ideia nasceu noite dessas enquanto tomávamos vinho e comíamos o nhoque da sorte no Sant´Annas. Uma amiga, da mesma faixa etária, comentou que em determinada situação estava visitando um amigo, enrolada numa canga, desprovida de sutiã e, inesperadamente, no meio da conversa, a dita caiu. Mais do que uma saia justa! Saiu tentando se recompor, mas o que tinha que ser revelado foi. Imaginei para o carnaval do próximo ano uma ala de mulheres maduras embrulhadas em cangas e ameaçando deixar cair em meio ao desfile. Não causaria qualquer impacto na pequena vila onde moramos, mas seria uma cena bem ridícula. As exibicionistas da 3ª. idade !
Estas tolas lembranças servem só para esquentar as teclas, pois é claro que um bloco desses não se cria nem somos loucas o suficiente… Mas compartilho esse pensamento para perceberem por onde anda a minha busca de inspiração em tempos de bombardeios políticos… Enquanto não sei o que escrever, monto quebra cabeças ou jogo paciência. Tudo no computador. Deve ter mais uma meia dúzia de dezenas de pessoas que fazem o mesmo e com quem quero dividir minha mais nova descoberta, um outro lado legal destes joguinhos de cartas. Quem brinca com isso sabe que existem momentos em que parece que não vai ter mais jeito, o jogo vai parar ali, nenhuma carta vai se encaixar e perder é a única certeza. Mas, de repente, aparece uma carta que não se estava prestando atenção e tudo muda. Todos os jogos vão se encaixando e pronto, encerra-se com louvor a paciência. Tenho uma alegria enorme quando isso acontece pois lembro que em algum momento da vida quando achei que nada ia dar certo, saía uma carta da cartola mágica e o problema se resolvia…. As vezes está ali, bem ao lado, e a gente não consegue enxergar…. É aprender a ver com olhos menos viciados, uma das melhores técnicas para montagem de quebra-cabeças…. Quando não encontro uma determinada peça, faço pausa, mudo de assunto e ao voltar ela surge. É o desapego nos pequenos gestos…
Nestes últimos anos estou aprendendo a dar tempo para o olhar, perceber o que está no em torno, ver os pequenos milagres de cada dia. É soberba a luz entre as árvores no fim da tarde, o facho de sol que entra no box quando tomo banho bem cedo. Deixo seus raios aquecendo as minhas costas pois alguém me disse que é bom para espantar tristeza. Tristezas não tenho. Nem mesmo quando escuto uma música antiga, destas de rasgar os pulsos que vem na voz da Bethania… Estou me afiando na simplicidade e constato o quanto os meus amigos que estão nos grandes centros ficam sensibilizados quando posto uma foto no Instagram de um barquinho à deriva no rio, um vídeo da água correndo com a balsa, um pica-pau de crista branca, a orquídea Dora que sempre floresce, a abóbora que surgiu da terra de compostagem, o mesmo com os melões quase no ponto… Fatos do meu cotidiano, em casa ou a caminho ao trabalho…Viver tudo isso me dá uma enorme alegria mesmo sem inspiração para a crônica desta semana… Mas será que precisa ?
Sua vida,suas lembranças,esse paraíso em que vc vive já são boas inspirações.
Amo ler seu blog