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Invencionice

Quando criança eu desenhava com giz  no cimento do quintal casas imaginárias. Como em planta baixa de um projeto arquitetônico, minhas casas tinham portas por onde eu podia passar e janelas de onde eu via a paisagem que era a mesma, mas as transformava com imaginação. Os arbustos de cipreste eram montanhas, o pequeno quadrado de grama planícies, a bacia com roupa pra quarar era o lago e a água que pingava da torneira, os rios. Criava histórias fantásticas que ficavam apenas na minha imaginação.  Jamais ousei contar para alguém. Mamãe poderia dizer que era “invencionice”. Papai com certeza aprovaria e meus irmãos ririam das minhas bobagens…
Quando me tornei jornalista escrevi as histórias dos outros. Depois  escrevi alguns roteiros para o programa “Caso Verdade” na Globo, uma novelinha em 5 capítulos baseada em fatos verídicos. Escrevi projetos, estratégias de marketing, dezenas de releases, criei eventos, escrevi uma peça biográfica e 2 livros documentários.
Com o passar do tempo, esqueci que “inventava histórias” até uns 4 anos atrás acordar com uma idéia. Geralmente tenho insights antes ao sair da cama. Idéias básicas, práticas e criativas, mas nunca uma historia. Mas aquela manhã foi diferente.  Acendeu a luz verde da “invencionice” e escrevi o que veio a ser o argumento para o filme  “À Beira do Caminho”.
Uma historia para dizer que as pessoas podem se transformar, que às vezes um gesto simples pode tocar o coração e mudar uma vida.  Hoje em São Paulo assisti ao filme numa sessão para convidados em uma sala de cinema. E o filme é exatamente o que escrevi. Uma historia singela que com uma direção madura do Breno Silveira chega à grande tela de forma emocionante. O roteiro da Patricia Andrade colocou com precisão as palavras na boca dos personagens.  Poucas palavras, cinema é imagem, mas muito profundas. Lindo de se ver e se permitir emocionar. Chorei bastante, mas consegui segurar o pranto que queria vir em desespero.  Chorei pelo resgate da menina que inventava histórias. Obrigada Breno Carvalho, Lula Buarque, Léo Monteiro de Barros, Patricia Andrade, Luciana Brasil, João Miguel, Dira Paes, Vinicius Nascimentos e todos que fizeram e ajudaram para este filme acontecer. Vou voltar a desenhar com giz no quintal.
Em tempo : Estréia em agosto em todo o país.
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A estrada

Estrada Porto Seguro – Eunápolis

Quando viajo de carro e vejo uma casinha à beira da estrada, sem vizinhos, solitária, fico imaginando o que faz uma pessoa viver assim. Não sei se é uma escolha ou uma determinação do destino, mas sempre invento historia, crio personagens e isto faz com que as viagens sejam mais divertidas. De onde eu moro para uma “meia civilização” são alguns quilômetros de estrada. E hoje, indo para Eunápolis levar o Xico ao veterinário, lembrei que há alguns anos quando estavam construindo a Veracel, uma enorme fabrica de celulose aqui no sul da Bahia, para se tornar viável o escoamento do material produzido teriam que construir uma estrada unindo a indústria ao seu terminal marítimo. A estrada passaria nas imediações do distrito de Barrolândia, uma localidade pobre e pequena, e para definir o local exato realizaram uma audiência publica. Presentes os representantes da fábrica, autoridades municipais e os moradores. A fábrica sugeria um traçado sem comprometer o povoado, passando por fora, minimizando ao máximo os efeitos dos grandes caminhões e também do trânsito que seria gerado. Já os moradores exigiram que a estrada cortasse bem ao meio da localidade, com isso ganhariam ares de cidade grande. Um amigo envolvido neste processo, comentou que ouviu a seguinte justificativa de uma moradora ainda jovem : “quem sabe assim alguém passa por aqui e me leva embora.”

Os moradores ganharam, a linda estrada lá está. Quantos sonhos à beira de uma estrada! Não sei se a jovem saiu de Barrolândia, talvez os caminhoneiros apressados não parem nem para visitar o “brega”, mas o desejo de aventurar para outros lugares faz parte da busca do ser humano. As aventuras motivam, atenuam dias tristes, alimentam a alma. Eu continuo encantada com as estradas, vendo as casinhas à beira, fantasiando sobre a paisagem. Foi isso que me inspirou a escrever o argumento do filme “À Beira do Caminho” que Breno Silveira dirigiu e estreia em agosto.  É só esperar para conhecer a alma de um caminhoneiro.