Arquivo da tag: Vila de Santo Andre

Em sintonia com a vida

Inúmeros sites vêm anunciando um evento que, a princípio, começou em novembro de 2018 e hoje chega ao ápice com o equinócio de outono, quando o Sol distribui sua luz de forma igual, a ambos os hemisférios do planeta.  Do ponto em que estou há 15 anos, num pequeno povoado cuja única poluição é de raras queimadas e alguns carros de som, com tempo para ver o nascer da lua e do sol, perceber um vento mais frio com o aviso de chuva, maré subindo e descendo, canto dos pássaros, percebo também pessoas que chegam e partem. Muitos são turistas, outros buscam uma outra vida com mais qualidade. Nem todos conseguem ficar por muito tempo, tanto viajantes que não aguentam a falta de agitação, como os desejosos de um novo destino. Santo André é para fortes, tem algo de místico e mágico, tem algo de mix de tribos que nem sempre convivem em harmonia, tem algo de sedução e repulsa, mas isso só se descobre com o tempo. E quem se encanta volta sempre.

Entre os muitos passantes e chegantes surgem os místicos. A energia pura pulsante, muito mar, rio, matas, poucas torres distribuidoras de poluição eletromagnética, é um convite para a reflexão. Os praticantes de yoga já descobriram o caminho e já ouviram a lenda de que há um Santo André de ouro guardado no fundo dessas terras. O santo teria sido trazido por um padre temeroso que a imagem desaparecesse como tantas outras da sua Igreja. Dizem que este mistério acessa uma memória profunda dos que passam por aqui e querem descobrir a própria essência, o seu ouro interior. Tem algo que não vemos e nem tocamos. Apenas sentimos como o brilho do ouro no fundo da terra. 

No feriado de 12 de outubro Halu Gamashi teve esse sentimento ao atravessar o rio João de Tiba. Médium, paranormal, autora de 10 livros, criadora de técnicas corporais e sutis, atuando há mais de 25 anos como professora, participando de congressos e workshops sobre anatomia do corpo sutil, chakras, campo áurico, filosofia, saúde e comportamento humano em diversas cidades brasileiras e europeias, chorou ao cruzar o rio. Convidada a trazer suas técnicas terapêuticas para um workshop de ashtangha yoga, conta que sobre as águas, enquanto a balsa fazia a travessia de pouco mais de 10 minutos, sentiu como se estivesse chegando em casa, sem jamais ter pisado em Santa Cruz Cabrália, cidade onde o “Brasil” começou.

Baiana de Salvador, andarilha pelo mundo, morou em mais de 400 cidades em seus 58 anos, sempre seguindo as indicações do seu guia espiritual que diz a acompanhar desde os 3 anos de idade. Estava instalada em Lisboa, onde lançou livros e atuava com terapias quando, no início de 2018, recebeu a recomendação de seu mentor para uma nova mudança: a Costa do Descobrimento. Instalou-se em Trancoso onde vivera nos anos 80 mas não sentiu a mesma energia do passado. Ficou aguardando novas indicações até que veio o convite para o workshop em Santo André e, desde então, não mais saiu.  Por ter chegado ao povoado com a cabeça raspada é chamada por alguns de “a monge de Sto André” e conta como sua mediunidade surgiu na primeira infância:

“Penso que não escolhi dedicar a minha vida à vida espiritual. Hoje sei que antes de encarnar assumi este compromisso. Fiz esta descoberta aos vinte e nove anos de idade, porém, desde que nasci as idiossincrasias e as peculiaridades que naturalmente despertaram em mim fizeram com que, aos três anos de idade, alguns dos meus familiares buscassem na espiritualidade um remédio. Os médicos quando me viam adoecer, não conseguiam chegar a um diagnóstico e “doenças atípicas” era o que a minha família começava a ter como resposta. A falta de esperança, o medo de me ver morrer foi a porta que se abriu para que eles procurassem a espiritualidade a fim de restabelecer a minha saúde, e isto virou um hábito: eu adoecia (febre reumática atípica, paralização dos rins, pequenos infartos), os médicos não encontravam diagnóstico e eles me levavam à uma casa espiritual. Faziam isto escondido por temerem serem rejeitados pela sociedade em que viviam. Assim foi até os meus dezoito anos quando descobri que não precisava adoecer e sim conhecer, afinar minhas energias, alinhar-me”.

Em uma trajetória de grandes desafios, tanto físicos como mentais, muitas vezes foi apontada como louca e não conseguia se entender por ser tão diferente das outras pessoas…

“Disseram-me que a espiritualidade tinha um projeto para mim. Confesso que aos dezoito anos, muito ignorante ainda sobre esse mundo invisível, me senti invadida e pensava: ‘Como é isto? A espiritualidade tem um projeto para mim? Eu queria ter o meu próprio projeto’. Porém, apesar destes questionamentos, durante nove anos morei em uma chácara-escola que me iniciou nos conhecimentos e na magia branca dos elementos da natureza, a água, a terra, o fogo, o ar, a madeira, os rios, as cachoeiras”.

Sem querer se prender a qualquer seita, a casa aonde viveu nesse período não era religiosa. Não era candomblé ou umbanda. Era uma casa que estudava a influência das energias da natureza nos humanos voltada ao conhecimento e à medicina mais do que aos mitos e mitificações. Antes de completar 28 anos saiu da casa, era tempo de conhecer o mundo.

“Disseram que eu estava pronta para canalizar mensagens e que a espiritualidade me ensinaria outras coisas e daria novas iniciações.  E descobri, aos vinte e nove anos, o porque de toda a minha vida estar sempre perto das energias da natureza e desse mundo sutil. Se minha família não fosse tão preconceituosa este caminho não teria sido tão difícil: realmente encarnei com o compromisso espiritual e se lutei tanto contra os preconceitos da minha família é porque havia em mim um chamado, muito forte para me aprofundar nesse universo. ”

Halu lamenta que os temas espirituais, principalmente a inteligência espiritual, sejam tratados com descrédito, banalidade, superficialidade e ironia, principalmente por alguns paranormais que valorizam muito mais os fenômenos do que os seus significados. Neste processo de vida, um dia percebeu que seus chacras se abriam em fendas no corpo físico, como na testa, na palma das mãos e no plexo solar, causando um profundo estranhamento. Todas essas manifestações foram registrados em fotografias, acompanhados por médicos que jamais conseguiram chegar a um diagnóstico.  As marcas dos movimentos dos chacras estão presentes e o processo acontece com assiduidade, principalmente quando ela percebe movimentos estranhos no planeta.

“O fenômeno, em mim, sempre o compreendi como uma mutação, o crescimento de um órgão sutil que abriria os meus canais para aprendizados mais importantes. Foi este o valor que dei aos fenômenos: eles precisavam acontecer para gerar mutações no meu corpo material que me viabilizassem o acesso à informação, e hoje tenho certeza que se tivesse escolhido parar nos fenômenos, utilizá-los como forma de convencimento para outros – o que chamam de exposição mórbida – eu não teria cumprido a minha missão de alcançar uma comunicação, que volto a repetir, sinto-me na obrigação, dever e direito de dividir com quantos queiram ler ou ouvir”.

Halu explica em seus livros que o termo chakra (em sânscrito significa roda), são portais de entrada e saída de energias, com muitas funções; podendo ser definido como radares energéticos que sintonizam a relação entre o corpo físico, o períspirito e a alma, sincronizando o produto desta união com o Universo. Então, rodando ou girando, esses pontos captam as energias sutis do universo, distribuindo-as pelo corpo. Como resultado das suas vivências no mundo espiritual desenvolveu setenta técnicas terapêuticas que visam a harmonia e o equilíbrio nos corpos físico, emocional e espiritual através do alinhamento dos chakras.

Autora com mais de 10 livros publicados no Brasil e Portugal, dentre eles: Caminhos de um aprendiz; Plano inverso; Chakras, A História Real de uma Iniciada; Chakras, The True History of a Medium; Clandestina, O Resgate de um Destino; Conde Vlado, um Alquimista em busca da Eternidade; A Hermenêutica de Deus e o Código Original; Meditando com a Consciência Suprema e O Livro dos Sonhos Cabalísticos, Halu Gamashi há 20 anos ministra cursos de terapia em uma escola em Yverdon Les Bain, na Suíça. Desenvolveu também uma linha de produtos – Maberu – que tem auxiliado e melhorado a qualidade de vida dos seus pacientes. 

Uma das coisas que Halu Gamashi mais gosta em Santo André é sentir que está em um povoado onde o respeito às diferenças e a amizade são valores reais e objetos de permanente cultivo. Em 5 meses já apoiou projetos voltados às raízes e à cultura local, como a Festa de Iemanjá dia 2 de fevereiro, o Batismo de Capoeira, a abertura do carnaval bem no tradicional estilo baiano com entrega da chave da cidade a Rainha Moma. Seus pacientes e alunos que vêm de diversas partes do país têm trazido um novo movimento ao povoado. Até um suíço, campeão de snow boarding, está continuando sua formação e aprendendo português. Os seminários que realizava em sua chácara no interior de São Paulo, depois em Portugal e em tantos outros países, começam a ser realizados na Bahia. O próximo será de 17 a 21 de abril, Semana Santa onde compartilhará conhecimentos e aplicará técnicas como a fluidoretapia e leitura de aura. Em seu site publica constantemente artigos canalizados através de suas viagens astrais e, segundo ela, sobre Vila de Santo André há uma colônia espiritual. São cidades espirituais que servem de morada para os espíritos com algum grau de evolução, aguardando a reencarnação.  Quem sabe o Santo André de ouro perdido é sinal deste mistério ?

Foto : Cláudia Schembri

Publicidade

O cajueiro

IMG_20181009_075718748 (1)

Há 14 anos descobri os cajueiros ao aprender a conviver com os dois plantados no jardim de casa… Troncos com formas sinuosas, ora buscando o sol, ora se enterrando na areia e depois retomando seu caminho que ameaçavam os telhados. Deram poucos frutos, muitas flores, mas gosto de admirar a sua força, a determinação em crescer, mesmo sem receber muita água. Bastava a da chuva e às vezes alguma que do gramado escorria para seus pés…

Porém, com o tempo seus troncos saíram do meu jardim, atravessaram a servidão* e quase se derramaram no caminho, inibindo a entrada de veículos mais altos. Para evitar que derrubassem a frágil cerca de madeira da minha casa como também a cerca de eucalipto de outro vizinho, há algum tempo coloquei uma estaca aparando um pesado galho, tudo paliativo… Sabia que um dia teria que ser podado. Na verdade, o que me seduz são seus galhos, muitos secos, fazendo como um “túnel de acesso” ao meu paraíso… O portal da minha alegria…

Ontem o vizinho de servidão, proprietário da Pousada Victor Hugo, construída nos anos 90 por meu irmão Victor e seu sócio Hugo, veio pedir socorro. Precisa de forma urgente da entrada de um caminhão por uma questão estrutural do seu empreendimento e com os galhos é impossível…

Ouvi o pedido, prometi refletir e fiquei divagando sobre a necessidade relevante do vizinho e a estética poética dos galhos, às vezes misturados com bouganvilles, dando boas-vindas à quem chega. O vizinho é meu bem e meu mal. Se for feliz e próspero, serei também. Doeu profundo o tempo de vazio, o abandono, a pousada sem saber que rumo tomar, muitas vezes fechada por longo tempo. Só sobreviviam os jardins, por total dedicação do Beto, jardineiro da época do meu irmão. Havia amor e cuidado por aquele espaço que vi ser construído, estava na inauguração, acompanhei a expansão, e se tornou ponto de referência no povoado, recebeu elogios nos cadernos de turismo, estrelas referendando os bons serviços, e vi também a partida do meu irmão. Foram anos difíceis de um inventário empacado na morosa justiça no sul da Bahia, a desavença entre o sócio e a minha família e, por fim, a venda há 4 anos. Período de altos e baixos, e a bela Victor Hugo perdendo a identidade…. Até que há seis meses chegou um empresário paulista cheio de sonhos para ser pousadeiro à beira mar… Um respiro para o meu coração…

Nestas divagações, me coloquei no lugar do vizinho…. Conclui a importância da poda …. Clareou a servidão, tenho esperança que vai renascer com vigor, assim como a pousada.

*Servidão – um acesso público para o mar, muitas são tão estreitas que veículos não entram. Esta servidão é mais larga, com acesso a veículos exclusivamente para minha casa e para Pousada Victor Hugo.  

Escolhas

6637ad2e-2968-451f-80ad-410018aada7f

Esta semana, duas postagens com muitas curtidas e comentários levaram-me a refletir. Na primeira, me solidarizei com os jornalistas demitidos na Editora Abril; a segunda comemorando 14 anos morando em Vila de Santo André.  Os dois assuntos apesar de dispares, se encontram num mesmo tema: escolhas.

Quando optei em sair do olho do furacão das grandes cidades e vir para a pequena Vila de Santo André, eu não estava desempregada. Ao contrário, estava num excelente momento profissional. Era diretora de uma promissora agencia de eventos da qual fiz parte da criação, completamente integrada no mercado de jornalismo, produção, eventos e marketing. Não sei se foi Deus, o destino, a casualidade que me fincaram na Bahia para não ver o meu Rio de Janeiro desmoronar e descobrir que, mesmo a mais de mil kms distante, posso participar de qualquer processo que necessite uma profissional criativa, experiente, integra, disponível 24hs, texto bacana, capacidade organizacional, bem-humorada e pau para toda a obra.

Nada foi previsto, tudo aconteceu com um desejo de entender melhor a vida e experimentar novos desafios. E foi possível. O mundo é maior do que o Rio e São Paulo, há muito a se doar e ensinar em localidades menores.  Estou sempre somando em algum projeto social ou na gestão pública. Fui secretária de cultura e de comunicação, em duas administrações distintas, cujos prefeitos não compartilhavam da minha escolha política. Como técnica aprendi e ensinei muito em Sta Cruz Cabrália, pouco mais de 28 mil habitantes, e em Vila de Sto André, com menos de 800 habitantes. Todos os egos e vaidades existem, como em qualquer lugar do planeta, e aprendi como conviver é delicado e rico…

Como jornalista, graças a internet, estudei redes sociais, e atuo postando fotos todos os dias no @santoandredabahia, na página http://www.facebook.com/santoandredabahia/ e mantendo atualizado o site www.santoandre-bahia.com . Todas estas redes tem o obetivo de promover o destino turistico onde escolhi viver, e isso é trabalho… Sou voluntária na área de comunicação do IASA, uma ONG que oferece aulas de música; vice-presidente do Conselho de Turismo de Cabrália; e, como uma região turística hospedagem é o que muitos procuram, tenho uma pequena pousada com três chalés para receber amigos e amigos de amigos, de um jeito muito especial…

Em 14 anos escrevi dois livros, atuei como consultora de comunicação em crises empresariais, participei da criação de projetos que se tornaram grandes eventos, dei palpite, somei, acrescentei, descasquei abacaxis com primor. E, nesse ínterim, lendo jornais e revistas online, ainda tive o prazer de ver muita folha no chão se transformando em adubo, maré subir e descer, lua nascendo, sol se pondo, vento derrubando galhos, passarinho cantando… Vi uma pequena muda de roseira dar flor, ouvi o silencio na madrugada, sol amanhecendo no meu rosto, cigarras anunciando o verão, chuvas lavando a alma em longo e úmido inverno…. Plantei árvores, acompanhei cachorro morrendo e crescendo, passarinho no ninho, amigos chegando e partindo, primeira estrela; júpiter, marte e saturno no céu… Rezo todos os dias agradecendo o que tenho, a minha família, aos amigos e aos que não gostam de mim… Nas minhas muitas mudanças, nacionais e internacionais, sempre soube que tinha um lugar para voltar, era a casa dos meus pais… Esta não existe mais e meu único lugar é o que construí. Com muito mais qualidade, precisando de muito menos, entendi que o amor incondicional, a delicadeza, o compromisso com a verdade, a fidelidade aos amigos é o que importa…

Por isso, em tempos de escolhas e mudanças, para quem não sabe o que fazer da vida, fica a dica : experimente sair da caixa e começar uma nova história… O mundo é acolhedor… Sempre vale à pena…

De outras vidas…

IMG_20180609_112656728

Aprendi em casa a fazer e conservar amigos. Meus pais não se contentaram com os 5 filhos. Ajudaram a criar outros três, receberam muitos amigos e parentes em longas temporadas, numa época que onde 7 comiam, 10 comiam também!  Ensinaram que fazer e cuidar de amigos é um exercício, e aprendi muito bem a lição. Quando alguém desaparece vou atrás e, se não encontro, é sinal que partiu para outra dimensão… As redes sociais têm sido generosas com reencontros e, entre tantos amigos, hoje me permito reverenciar uma que, como disse sua mãe, “esta é uma amizade que veio de outras vidas”. Ela é um exemplo de determinação e generosidade.

Aos 38 anos, empresária bem-sucedida, formada em duas faculdades, pós-graduada, completando um MBA, teve um AVC. Como sequela, ficou com palidez no nervo ótico, o olho onde através da câmera via o mundo e fotografava por puro deleite. Mas superar foi fácil. Aprendeu a fotografar com o olho esquerdo, desfez a sociedade na farmácia de homeopatia em BH, e atendendo a sugestão da neurologista mudou a vida antes que a vida mudasse ainda mais o seu caminho.

Quando estava iniciando um novo ciclo, veio trabalhar comigo na Secretaria de Cultura de Cabrália e alguns meses depois descobriu que estava com esclerose múltipla. Decidiu rejeitar os tratamentos convencionais que, segundo ela, eram muito invasivos e comprometiam o paciente e, por ser de uma família que se dedica à saúde e a educação, com suporte de alguns médicos estudiosos e pesquisadores, fez um mix de tratamento envolvendo a alopatia, antroposofia, homeopatia, acrescido de espiritualidade e muita fé. Alguns médicos ainda não entendem como conseguiu superar a doença auto imunine, mas o fato é que hoje ela é fotógrafa, atua como voluntária em projetos sociais e, quando o mar está tranquilo, desliza com seu stand up paddle pelas águas de Vila de Santo André… Salve Claudia Schembri em seu aniversário… Amiga, irmã, que todo dia me mostra que a fé move montanhas e é possível começar de novo !

Comparações

foto-claudia_schembriEmbaixo da amendoeira, vejo os meses de verão acontecer na praia de Santo André…Amigos chegam para férias, contam as novidades do ano que passou, e é impossível não notar as marcas do tempo… Uns mais gordos, outros frequentaram academia estão malhados, percebo cabelos que ficaram grisalhos enquanto outros mais tintos, comentamos quanto foram prósperos ou difíceis os negócios, a política ou o simples fato de termos sobrevivido. Um ponto é fatal: silenciosamente todos se comparam…. Isto é inerente ao ser humano, o animal não olha para o outro para ver se está mais velho ou mais jovem, gordo ou magro, só mesmo o homem.

Lembro que a primeira vez que me percebi nas comparações foi no início da adolescência quando trocávamos de roupa para a aula de ginástica, e discretamente todas queriam saber quem já usava sutiã ou havia menstruado.  Às vezes mentiam quanto à menstruação para serem dispensadas das aulas… Depois, um pouquinho mais velha, a pesquisa ficava nas que eram ou não virgens, comparava-se o tamanho do salto do sapato, a roda do vestido, o perfume Avon ou importado, e por aí seguia numa disputa sem fim…. Tudo muito silencioso…Depois comparava-se o marido, o emprego, o carro novo, o apartamento, as férias no exterior, a casa na praia ou na serra, a escalada social…

Hoje me percebo curiosa em saber a idade das mulheres da minha faixa etária para ver quem está fisicamente melhor…Não sei qual o critério que uso para saber o que é melhor, mas discretamente analiso se os antebraços estão firmes para dar tchauzinho,  como estão as celulites nas pernas e no bumbum, a gordura que ganha forma nas costas e nos seios, a barriguinha, as varizes, as rugas em volta dos lábios denunciando as fumantes, tristes comparações mas totalmente verdadeiras… O tempo é implacável, esta não é uma boa disputa mas é a realidade desta vida mais longa e liberta que ganhamos… Mamãe jamais se permitiu ao se aproximar dos 70 colocar os braços de fora muito menos a barriga em um maiô de duas peças… E nós só tínhamos 30 anos de diferença… Tudo correu muito rápido e vamos tentando nos adaptar à nova realidade. Às vezes sinto que há um fio da navalha entre o adequado e o ridículo, mas é impossível julgar pois cada um vê no espelho a imagem que interessa.

Desde que voltei a praticar Pilates tenho pensado no meu bem-estar físico, pois as pernas que abalaram Paris jamais voltarão. Ficaram nas fotos e nas lembranças de quem viu. A flexibilidade do corpo e da mente são meus grandes objetivos. A agilidade dos pensamentos e a facilidade em me movimentar, cruzar as pernas, esticar os braços, andar firme, são meus desafios… Sei que com a determinação e juventude que tenho –  eu já contei que acredito ter 35 anos ? – vou bem longe.

 

Foto :  Cláudia Schembri

Outros carnavais

leapaulo

Sentada a beira do rio esperando o bloco Unidos de Santo André passar, lembrei da foto com Paulo Martins que recentemente emoldurei e pendurei na parede da sala e me remete a outros carnavais. Meus pais se conheceram num baile de carnaval. Minha mãe era a rainha, ficava no trono acenando para os súditos; meu pai entrou no baile como penetra, não era sócio do clube e vestiu uma fantasia de dominó (não consigo imaginar!!!) com capuz na cabeça para não ser reconhecido… Ouvi esta história dezenas de vezes quando me vestiam de bailarina ou qualquer outra fantasia que “herdava” das primas ricas e me levavam para o clube com um saco de confete, um pacote de serpentina e uma lança perfume Rodo Metalica.

Sempre me senti ridícula fantasiada. Até mesmo quando adolescente saía no grupo das  garotas da rua da Cascata vestida de índio ou melindrosa para brincar no baile no Montanha Clube. Em grupo o vexame era menor. Deve ter sido isso que me estimulou a aceitar o convite dos incríveis Stenio Pereira e Equio Reis para sair na comissão de frente da Portela. Na verdade era um séquito que acompanharia a colunável milionária Beky Klabin em sua estreia no carnaval.  Equio e Stenio eram dois artistas sensacionais que marcaram o fim dos anos 60 e início dos 70 em Ipanema. Um baiano, ator e diretor de teatro, o outro arquiteto carioca, foi o primeiro casal assumidamente gay que conheci. Juntos criaram uma grife, um estilo que fez sucesso entre artistas e descolados.

Beky era uma grande figura. De origem turca, chegou menina ao Brasil, casou com o empresário do ramo de papel e celulose Horácio Klabin com quem teve dois filhos. Foi jurada do programa do Chacrinha, namorou o cantor Waldick Soriano, o cirurgião plástico Hosmany Ramos que anos depois foi preso e julgado como traficante… Ela “causava” na sociedade carioca e por ser apaixonada por samba foi parar na Portela. As portas da sua cobertura na Av. Vieira Souto – o metro quadrado mais caro do mundo! – eram abertas para ritmistas e passistas realizarem os ensaios da “trupe” que a acompanharia na avenida. Claro que tudo regado a muito champagne e caviar. Não lembro quantos éramos naquele carnaval de 1972, mas viemos em torno de Beky que “carregava” um vestido branco, coberto de plumas e pedrarias. Evoluíamos numa coreografia ensaiada durante semanas seguindo a letra do samba “Ilu aiê odara, negro cantava na nação nagô…” Dizem que as joias que Beky usava eram de muitos quilates, por isso, discretamente, alguns seguranças a acompanhavam. Ainda não havia o sambódromo, as escolas se exibiam na Presidente Vargas, e quando terminou o desfile, lá estava nos esperando o seu motorista com o porta malas da Mercedes aberto repleto de bebidas e comidinhas para o grupo… Lembro voltando para casa com a maquiagem escorrendo no rosto …

Beky foi a primeira personalidade do “high society” a desfilar em uma escola de samba o que causou furor e se tornou um escândalo… Sua personalidade era tão marcante como referência em glamour e poder, que segundo consta, Gilberto Braga nela se inspirou para escrever a personagem Stela, vivida por Tônia Carrero na novela “Agua Viva” em 1980. Resgatei um de seus pensamentos: “Assim como Stela, detesto praia. Mas mando o copeiro buscar a água do mar para jogar no meu corpo porque queima mais”.

E, na doce brisa do fim de tarde do sábado de carnaval, vendo a explosão de cores do por sol relembrei deste carnaval enquanto esperava o bloco passar… Sem abre alas e coreografia, prefiro ver a vida de camarote…

Na foto abaixo, Beki Klabin (10 de setembro de 1921 – 20 de agosto de 2000.

beki-klabin-portela-1974-marceloguirelli

 

Meu Natal

dd4dc2c5-a22c-4f2b-9efd-f89009b4ef11Então é Natal… Não vou cantar a música da Simone nem lembrar que desisti de festejar há 15 anos… Este ano tudo está diferente. Em julho quando vi o meu braço esquerdo imobilizado devido uma queda, tive tempo para refletir sobre a importância dele… Sou destra, mas a parceria é dos dois… Pra escrever, pra me banhar, pra dirigir, pra comer, pra tanta coisa, inclusive costurar… E aí me deu uma vontade enorme de fazer bonecas, mas como ? Então para estimular o braço a ficar bom, prometi a mim mesma que faria muitas bonecas para distribuir às crianças da escola infantil de Santo André… 22 meninos e 19 meninas…   E assim, depois de 1 mês de gesso, dois meses de fisioterapia, fui recuperar os movimentos brincando de fazer bonecas de pano, com enorme carinho e amor, imaginando cada criança que iria receber. Detalhes de laços de fita, babados, bordado inglês na saia, arremate feito a mão nas camisetas dos meninos, cabelos de lã … Estes meses se passaram e com a ajuda da Lelê na “”costura reta” completei minha missão… Ainda fiz sacos para embalar e coloquei o papelzinho com o nome da criança para Papai Noel não se confundir… A festa aconteceu a semana passada e não assisti. Acho que iria me debulhar em lágrimas e tinha a desculpa da chegada de um amigo… Agradeço à Claudia Schembri que fez as fotos, a Sara Amorim que gentilmente trouxe de sp tecido marrom que não encontrei por aqui e Patricia Farina, diretora do Centro Educacional Maria Marta, que me permitiu fazer este sonho. O meu Natal já rolou… Não vi Papai Noel, mas não importa…

Em tempo : as bonecas de pano que faço são inspiradas na Tilda, criada pela design norueguesa Tone Finnanger que também desenvolveu outros tantos produtos em tecido como coelho, colchas, almofadas, etc… A minhas Tilda tem 53cm de comprimento, olhos pequenos, bochechas rosadas e pescoço alongado… Como todas as Tildas do mundo não tem boca, as crianças falam por elas…

66bcf81b-e603-4081-9539-90feb77bfb1b

520c249d-87e3-4e5d-9430-d8a54415cc1f

21377a24-84ca-41bc-b4c4-a9c3a91a03d9

4e77ef88-97c9-4246-b926-809d31917b21

 

798e2795-2adc-47dc-80f7-5341978b03d547ea271a-5940-4c66-b7bf-0c0bec9958f6

Viva!

11129843_1029878993690528_1316757353_n (1)Pouco mais das 5 da manhã quando saí para a praia, olhei o quadro na varanda com fotos ​de muitos amigos e vi quantos já partiram… Nem chegaram a minha idade… ​Estou no lucro mesmo fazendo aniversário em tempo de ressaca de Natal e Ano Novo. Aprendi a festejar assim. Alguns amigos cansados de festas, muitos viajando, outros começando dieta, mas nem por isso deixei de ser feliz apagando as velinhas com grande ou pequena platéia.

Fui caminhando pela servidão, vendo o sol nascendo no mar e agradecendo pela vida… Extasiada com o  escândalo do canto dos pássaros, a beleza do flamboyant que por falta de chuva continua florido, tudo é motivo de gratidão. Aniversário é dia de reverenciar os antepassados, mesmo os que não conheci .  Estiquei a canga na areia e olhando o mar com o sol nascendo agradeci à família, ao meu filho, aos meus mestres, aos amigos de sempre, aos amigos recentes, aos amigos virtuais, muitos eu nem conheço a voz, nunca vi pessoalmente e leem meus textos, comentam meus posts, me querem bem…

Este aniversário chega acompanhado de uma reflexão promovida por um curso de Eneagrama que aconteceu esta semana em Vila de Santo André. Ah! esta vila sempre surpreende! Adriano Fromer Piazzi é um editor de livros bem-sucedido, nos últimos anos tem se dedicado a este estudo e aproveitou a semana para dar um curso com as primeiras noções. Eu conheço o assunto, estudei em dois workshops, mas num pré aniversário voltar a pensar em quem realmente sou foi mais que perfeito.  Eneagrama não tem a ver com signos, não vem no gene e nem se desenvolve com a educação familiar. São 9 perfis de personalidade, fala-se sobre isso  desde a antiguidade. Nos últimos tempos passou a ser uma ferramenta muito usada para autoconhecimento e por empresas para selecionar os profissionais adequados à cada função.

Neste curso de dois dias mais uma vez constatei que sou forte, obstinada, firme, confrontadora e não peço ajuda.  Como é duro não mostrar a fragilidade… Sou rebelde, mandona, radical… Já fui bem mais, nos últimos anos a vida me amaciou.  Assumo o controle do que faço, dos assuntos mais complicados aos mais simples, e como já ouvi dezenas de vezes “entrega para a Léa que ela resolve”. Falo o que penso, tenho uma ética muito pessoal, acredito na justiça e na integridade. Sou de explodir mas me recupero rapidamente. Nada como uma noite para aliviar. No dia seguinte passou, não guardo mágoa, posso ignorar quem me fez mal, mas não desejo o mal. Adoro a verdade, não consigo atuar nas meias palavras. Tem que ser certo, reto. Sou generosa, boa parceira, pau pra toda obra.​

Revi meus sentimentos e atitudes. Alguns a favor, outros mais delicados,  mas saber quem sou simplifica tudo. Sei aonde estou pisando e mesmo  quando parece que tudo vai desmoronar não tenho medo. Medo apenas de ter medo. Revi também a personalidade dos outros tipos. Do super exigente, ao temeroso, passando pelo romântico e o mental. Os que empurram com a barriga, os que não querem aplausos e os que sofrem por não ter… Bom constatar que não somos iguais, isto me reafirma a importância de ter mais respeito ao semelhante e, numa boa, eu não aguentaria  conviver apenar com Leas.

Jamais imaginei quantos anos viveria e aonde chegaria. Fazendo o que ? Com quem ? Não pensei sobre isso nem aos 20, nem aos 40, quanto mais passando dos 60. Fui fazendo a vida com o que se apresentava. Um dia de cada vez, sem muitos planos a longo prazo, com um enorme prazer em estar no momento presente que foi se desdobrando e me trazendo presentes. Presentes em forma de amigos, desafios, afetos, alegrias, conquistas, amores, aprendizados…

Este ano vivi mais Santa Cruz Cabrália, a cidade da minha doce Vila de Santo André. Expandi conhecimentos, fiz amigos e sou grata ao Prefeito Jorge Pontes por ter me convidado para ser Secretária de Comunicação. Um aprendizado todos os dias. Este ano me encantei com as aulas de cerâmica, dar forma ao barro, ver queimar, colorir, transformar em peças… Costurei menos do que queria, rezei bastante…

Ah! vida!!! Quanto ainda por fazer ! Mais amigos, mais conhecimentos, mais esperança, mais obras em casa, mais hóspedes, mais saúde, mais risadas, mais lágrimas de alegria, mais surpresas… Que coisa boa é estar ainda por aqui… E  que venham os dias, meses e anos que tiverem que vir e eu serei eternamente feliz !

 

 

 

 

 

Toque

massagem-terapeutica-4Na cama, antes de dormir, creme nos pés e nãos mãos; no rosto pela manhã e à noite, nos cabelos antes do mar, óleo no corpo durante o banho e assim a pele, considerada o maior órgão do corpo humano e o mais pesado, vai sendo tratada. Dias após dia poucos toques sem muita atenção. O conjunto da obra se movimenta, as vezes estala um joelho, o pescoço fica tenso, um braço encrenca com o gesto repetitivo do mouse, mas a vida segue… Como se nada mais existisse a não ser  movimentos quase que automáticos, repetitivos, sem graça…

Até que um dia, o inesperado convite para a entrega do corpo à uma maca, numa sala silenciosa, aroma de essências, toalhas mornas sob a pele, as mãos começam tocando a sola do pé e reencontro o prazer de receber uma boa massagem…

Ah! Como estava com saudades de mãos profissionais esticando meu corpo, fazendo vivos os ossos, desfazendo os nós dos pés, apertando o couro cabeludo, puxando as orelhas e tudo isso com o aroma dos óleos … Nós pés uma gota de vetiver, gerânio em todo corpo, nas costas eucalipto e lavanda, laranja no abdome, jojoba no rosto e a delícia de respirar profundamente estes delícias… Prazer do tato e do olfato…

Incrível a capacidade que temos de não nos dar pequenos prazeres… Outro dia uma amiga veio passar uns dias em casa e confessou que não tomava banho de mar há mais de 20 anos… Outra passou uma semana andando descalça, havia esquecido como era bom pisar na areia, na grama e na terra… Comecei a lista o que estou deixando de fazer para recuperar o tempo esquecido… Já saí de bicicleta, a noite vou ver estrelas (aqui tem milhares) e antes do dia telefonar para alguns amigos em lugar de curtir no Face… A vida muda, ainda bem !!

Quem vier à Vila de Santo André e quiser conhecer este prazer marque uma sessão com a Jôrene Ferro na Pousada Terra Morena